Era uma vez, um país que sobreviveu a uma ditadura militar
pesada, e que depois de muitas mortes de protestantes, muitas repressões à
imprensa, muito sofrimento e pouco reconhecimento, o povo ganhou! E aos poucos
começou a ganhar sua tão esperada democracia. Foi um início lento, os novos
governantes começaram a elaborar a constituição federal que falava em igualdade
e liberdade. Todos começaram a ficar muito felizes, pensando “Agora sim! Agora
nosso país vai pra frente! Agora sim nós vamos crescer!”.
Mas com o tempo, na espera da aplicação pelo estado desses
direitos tão bem escritos e tão desejados por todos, o povo foi se esquecendo
de cobrar de seu governante a eficácia dessa mesma constituição cheia de
direitos humanos, que dava gosto de ler. Logo, os “espertinhos” e egocêntricos
que estavam no poder, tomaram proveito da inércia da população, que acabou se
acostumando com a ideia de trabalhar até morrer, sem ver aquela linda constituição
começar a literalmente vigorar.
Naquele país, existia um grande aliado do governo dos
“espertos”, era uma certa emissora de televisão, que dominava o país e fazia
lavagem cerebral na população, transmitindo para toda a população, todos os
dias, aquilo que o governo queria que eles achassem que estava acontecendo,
maquiando a realidade. A aparência que era passada era a de um estado que estava
crescendo e se desenvolvendo, e que a qualquer momento, todos teriam,
realmente, uma vida digna e poderiam ter orgulho de falar que viviam em um país
democrático.
Mas, mais de 20 anos se passaram, e nada do desenvolvimento
chegar, nada do crescimento acontecer. E, aqueles manifestantes que suaram e
gritaram para revolucionar o país, já estavam cansados, não possuíam mais
forças para protestar por tudo aquilo que continuava errado e precário. Começou
então, uma indignação destes populares, mas não contra o estado, mas sim contra
os jovens que agora teriam forças para combaterem o estado, como os mais velhos
fizeram no passado, mas que não faziam nada para mudar o país. Acontece que
muitos jovens já estavam acomodados com a vida “classe média” que possuíam, estavam
tão bitolados com o mundo em que viviam que ninguém mais sabia diferenciar
democracia do que realmente estava acontecendo nesse país.
Até que um belo dia manifestantes, em uma das capitais mais
populares e poderosa economicamente, resolveram sair nas ruas para protestarem
contra o aumento das passagens do transporte público, que ainda era muito
precário e atendia mal a população, mas todo ano encarecia mais um pouco.
Parecia tudo lindo, uma realização, finalmente aquela inércia popular estava
começando a acabar, e o país a caminhar, lentamente, para um caminho de
igualdade. Mas o pior aconteceu, uma manifestação pacífica foi atacada
violentamente por policiais, que nem se quer estavam preocupados se machucariam
alguém ou não. Estavam simplesmente obedecendo às ordens do chefe do executivo.
E a repressão foi só piorando, muitos machucados, e até mesmo a imprensa, que
não fazia parte da emissora sugadora de cérebros, estava sendo atacada. A
manifestação acabou em caos total.
A emissora dos políticos mostrou para aquela parte da
população, que ainda estava desacordada dos absurdos do estado, que os
manifestantes eram os errados da história, que foram eles que atacaram os
policiais primeiramente, e por isso, os militares precisaram usar da força
física para contê-los. E muitos dos populares inertes acreditaram no que viram
na TV.
Mas, o que o estado não esperava é que esses manifestantes
já estavam preparados, a tecnologia já existia em suas mãos, diferentemente de
20 anos atrás. Muitos filmaram e fotografaram toda a agressividade sem motivo
usada pela força policial, e usaram do maior meio de divulgação de informações
do mundo, colocaram tudo na internet. E a polêmica começou. Os políticos
começaram a ficar preocupados com aquele alvoroço todo. A população inerte,
juntamente com aqueles manifestantes que já haviam acordado, começaram a
questionar: “cadê a democracia?”, “onde estão os nossos direitos?”, “temos que
acabar com a corrupção estatal!”, “policiais, vocês estão do lado errado!
Afinal de contas, vocês também estão sendo roubados!”
A indignação foi crescendo em questão de dias, o estado
estava desesperado, temia a força da população. A polícia não conseguia mais
conter os manifestantes, eles, agora, eram em um número muito maior do que os
militares, e não era apenas em uma cidade, o país inteiro começou a gritar
pelos seus direitos constitucionais pelas ruas.
Até que um certo dia, o chefe do executivo não mais
aguentou, cedeu a pressão popular e pediu para sair, admitindo não saber
governar. Humilhado, foi julgado pelo Tribunal Superior, juntamente com todos
os outros políticos corruptos e ladrões, por todos os crimes que cometeram. E
assim, foram sentenciados e condenados, acabaram atrás das grades.
A população estava feliz e confiante, sabia que a partir de
agora tudo seria diferente. Só entraria no governo quem eles realmente achassem
ser digno de governá-los. As eleições aconteceram, e finalmente um candidato
foi escolhido. Ele tinha sorriso cativante, os cabelos um pouco grisalhos, o que
lhe dava certa credibilidade, tinha um discurso democrático e esperançoso.
Agora sim, dessa vez, ia dar certo, o país ia mudar.
Após a sua posse no governo, o tão cativante chefe do
executivo começou a rir, sem acreditar que realmente estava no cargo mais
importante do país, novamente. Preferiu não causar estardalhaço com sua
felicidade, não queria chamar a atenção dos mais desconfiados. Ele sabia que
aquela população não tinha memória muito boa, que esqueceriam logo do escândalo
que passou há muitos anos atrás, quando sentava naquela mesma cadeira. Só quem
lembrava, que aquele senhor cativante e sorridente já havia sofrido um
impeachment quando ocupava aquele mesmo cargo, eram os mais velhos, que não
tinham mais forças para gritar suas reivindicações e mostrar a todos que um
novo erro estava sendo cometido pela população.
E assim o tempo foi passando, e a população foi esperando...
(Mariana Magalhães)